segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Quando a mentira é a verdade , caso da irmã de Eliana

“Mentir é ruim”, diz a professora de jardim de infância, com o dedo indicador apontando ao céu. De crianza ensinam o valor da verdade. Porém, todos mentimos de algum jeito. Existem mentiras brancas, as mentiras pequenas e por aí vai. A mentira não necessariamente é escura, ruim, magoante, frente da verdade alva, pura e boazinha. O negocio tem cinzas.

Segundo uma definição, uma mentira é uma “expressão manifestação contraria a o que se sabe, acha ou pensa” e mentir é “fingir ou aparentar”. Isto é, um discurso pode ser “mentiroso” se a pessoa que o dizer achar que o falar é falso. Neste sentido, mentir é dizer uma mentira de forma consciente.

O problema é que no principio da intenção de uma pessoa não se esgota nas suas motivações conscientes. Existem alguns pensamentos que não tem acesso à consciência e que podem influir no jeito em que se percebe o mundo.

A Tamara tem 35 anos e faz 12 anos está casada com o José, três anos mais velho de que ela. Não tem filhos. Ela trabalha como gerente de uma empresa multinacional. Fala que não esta apaixonada pelo marido e sente que não se preocupa com ela nem é “romântico já faz vários anos”. Conta que o mais importante é a sinceridade e honestidade. A terceira sessão ela diz: “Eu nunca trai ao meu marido”.

Na sessão número doze Tamara, de maneira indiferente, faz um giro inesperado: conta, como um dado mais, que desde faz dois anos tem um relacionamento amoroso com o Vice presidente da companhia onde trabalha. Garante sentir vergonha e não ter vontade de contar. O psicólogo propõe para ela uma “pequena” pergunta para refletir: “O porquê sentiu vergonha em contar isso antes ?” Aconselhamos olhar o artigo da infidelidade em Opinião Sul Jovem março 2007

A Tamara fala em sessões posteriores que não contava do seu relacionamento amoroso com João, porque ela percebia na figura do psicólogo a imagem de um pai, quem sempre dizia que “tinha de ser uma esposa fiel”. Diz que é a primeira vez que faz algo semelhante e que por momentos “não se reconhece”. A paciente parece estar duvidosa, confusa, não se termina de reconhecer, mas por outro lado, começa a enxergar algo da sua verdade.
Tal vez ainda não tenha vontade de contar porque não tem muito claro onde você está em todo o que está acontecendo – fala o psicólogo. Ela responde afirmando e lacrimeja.

Poderíamos supor por este e outros comentários da paciente que “a mentira” para o profissional responde a não poder aceitar, num primeiro momento, sua relação paralela: esta era a “verdade” de Tamara. A “mentira” tratava de ocultar esta divisão entre o que devia ser e o que estava acontecendo. A mentira de Tamara mostrava o centro de sua “verdade” como pessoa.

“Muitas vezes as mentiras podem revelar a verdade sobre a essência de quem a enuncia, portanto não se mente por acaso com qualquer coisa, mas que a mentira possui algum fragmento, alguma marca particular da historia de quem a fala ”, explica Silvia Justo, professora supervisora de Centro Dos. E, além disso, adiciona: “Há mentiras enunciadas com intencionalidade consciente e outras enunciadas com intencionalidade inconsciente (não sabe que está mentindo). As duas fazem perceber o particular, do subjetivo de quem as enuncia. O ocultamento é outra coisa, funciona como velo para os assuntos que não funcionam no homem, que não existe felicidade, que não todo dá certo, que o outro tem fissuras, limites, que está restrito”. Em definitiva: “O paciente se mente a si mesmo muitas vezes como uma forma de se preservar da verdade, que lhe poderia produzir uma dor maior como a magoa ”, resume.

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